segunda-feira, 3 de agosto de 2009

FAMÍLIA HOMOAFETIVA, UM RECONHECIMENTO NECESSÁRIO


A família brasileira sofreu profundas alterações com o passar dos tempos, sobretudo com o advento da Constituição Federal de 1988. A família patriarcal, com os valores introduzidos pela Constituição entrou em crise. Atualmente, não se fala somente naquela família tradicional formada pelo pai, o trabalhador, a mãe, que cuida dos afazeres domésticos e filhos que vão seguir os passos do pai. Hoje, existem várias modalidades de família, entre elas a família unipessoal, anaparental, reconstituída, monoparental, entre outras. Porém uma modalidade de família tem dificuldade de ser reconhecida, tanto socialmente quanto juridicamente, qual seja, a Família Homoafetiva.
Pois é, muitos acreditam que uma união formada por duas pessoas do mesmo sexo não pode ser configurada como família. Conforme art. 1723 do Código Civil, para caracterizar uma união estável é necessária a convivência pública, contínua e duradoura, com o objetivo de constituir família, porém, nesse mesmo artigo, é explícito que somente existirá união estável entre homem e mulher.

Anteriormente, as relações homoafetivas até eram reconhecidas, porém reconheciam tais uniões como sociedades de fato, vejam o absurdo, uma relação entre duas pessoas que se amam era equiparada a uma sociedade comercial, logrando proteção apenas na parte patrimonial.

Hoje, o direito de família é visto sobre um prisma constitucional, em que os princípios da dignidade da pessoa humana e da igualdade são cada vez mais reiteradamente invocados na nossa Carta Magna. Através de tais princípios que a justiça, principalmente a Gaúcha, vem alcançando decisões judiciais de enorme inovação dentro do nosso ordenamento jurídico.

Entendo que, uma vez sendo preenchidos os requisitos de afetividade, estabilidade, ostensibilidade, independente da união ser entre duas pessoas do mesmo sexo, esta família está reconhecida e protegida constitucionalmente. Não dar proteção legal a essas famílias infringe claramente o princípio da dignidade humana e o princípio da igualdade, sem falar no cerceamento da liberdade sexual das pessoas.

Não é o fato de não ter previsão legal expressa de proteção a essas famílias que as mesmas irão ficar desprotegidas, desamparadas, ausência de lei não é ausência de direito.

A mudança começou quando a justiça alterou a competência das varas cíveis para as varas especializadas de família para apreciar questões que diziam respeito a uniões entre pessoas do mesmo gênero, reconhecendo que tais uniões entremeiam-se no rol das “novas famílias”, começando a aparecer, assim, uma nova jurisprudência relativa ao assunto. Começaram a surgir decisões que reconheciam o direito de agir, antes não admitido, deferiram herança a parceiros do mesmo sexo, adoção de menores por pais homossexuais entre outras decisões importantes. Em todas essas decisões houve um grande enfrentamento a uma cultura conservadora e a uma jurisprudência que se apegava a um conceito sacralizado de família. Há de se congratular a ousadia e coragem do judiciário gaúcho por tais decisões.

De certo que ainda não temos nenhuma disposição legal específica que reconheça o direito dos casais homoafetivos, porém tal lacuna é preenchida, como nas decisões anteriormente mencionadas pelos princípios da dignidade da pessoa humana e da isonomia. O homossexual é pessoa, e como tal merece a proteção que a ordem jurídica confere aos heterossexuais em situações análogas. Então, no momento em que o judiciário der juridicidade às relações homoafetivas, a sociedade começará a tratá-las com mais respeito, pois cada cidadão tem o direito de viver da maneira que melhor lhe aprouver.

Carlos Eduardo Lamas, Especialista em Direito de Família PUC/RS

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